Sumidoiro's Blog

01/07/2016

ÓCIO E PRAZER

Filed under: Uncategorized — sumidoiro @ 7:12 am

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Na Idade Média, havia muitos frades que tinham o costume de andar a pé. Nas suas caminhadas, para alívio da solidão, alimentavam a mente não só com palavras do breviário, mas também com sonhos e fantasias. Dizem que assim fazia um franciscano, conhecido como frei Michael of Kildare. Para tanto, compilou, provavelmente na Irlanda – no início do ano 1330 –, o texto popular The Land of Cockayne, transformando-o em seu livrinho de bolso(1). Descreve uma terra melhor que o paraíso celeste e começa assim:

Post - CocaygnManuscrito “The land of Cockayne”. À direita, transcrição em letras modernas.

Para muito além do mar e oeste de Espanha,
Há um país chamado Cocanha.
Nenhum lugar na terra a esse se compara,
Em tanta doçura e bem-aventurança.
Embora o Paraíso seja justo e brilhante,
Cocanha é uma versão mais refinada. 
No Paraíso, o que tem para ser visto,
Senão gramados, flores e ramos verdes? 
Embora as alegrias paradisíacas sejam doces,
Não há nada para comer, apenas frutas;
Nenhum banco, nenhum quarto e nenhuma sala,

Nenhuma bebida alcoólica, nada disso.
Seus habitantes são poucos, 
Elias, Enoque, os dois apenas; 
Eles devem achar que lá é chato.

O tema aborda um dos mais antigos mitos da humanidade, qual seja, o de alcançar algum lugar maravilhoso, onde se possa viver sem trabalhar e gozando de prazeres sem fim. Mas, antes de tudo, é preciso repetir que não se trata do paraíso celeste ou mesmo de alguma versão banal do paraíso de Adão e Eva. Pelas vantagens que oferece, esse outro ganha de todos.

Várias utopias semelhantes disseminaram-se pela Europa, em diferentes épocas. Na França, chamaram-na de Pays de Cocaigne; na Alemanha, Schlaraffenland; na Espanha, País de Jauja(2); na Itália, Paese de Cuccagna e vai por aí afora. Tal foi o sucesso da fantasia que, com o passar do tempo, ela espalhou-se por inúmeros lugares, até mesmo o Brasil, onde também dela se fala.

Quando surgiu a lenda ninguém sabe, tampouco a origem da palavra. Contudo, a denominação aparece num poema jocoso, provavelmente recolhido por volta de 1230, onde se fala de um certo abbas*(*abade) Cucaniensis. Ademais, o nome Cuccagna tanto identifica um antigo castelo existente em Treviso, como aparece em uma carta, datada de 1188(3), onde é citado um tal de Warnerius de Cuccagna. Mas ainda há inúmeras referências e muito antigas, à essa terra de tantas maravilhas.

Otexto logo abaixo – traduzido do francês –, é o cabeçalho de um cartaz, do século XVII, cujas ilustrações e legendas descrevem o Pays de Cocayne, desse modo:

“Há um país pra lá da Alemanha, abundante de todos os bens, ao qual chamamos Cocanha, onde cada um, sem nada fazer, pode ir viver quando quiser; e ter roupa sem precisar de dinheiro, sempre que quiser; sem suar, nem sofrer, tem-se o que quiser. Aqueles que amam o trabalho, renegam esse lugar. Molengas e preguiçosos ali são bem-vindos e, é certo, se sentirão muito bem entretidos. Acreditarão que estão no paraíso terrestre e, por nada, desejarão trocar de lugar. Não há onde estar melhor e sem sofrimento, tão somente para desfrutar, rir, beber e comer.”

E o complemento:

Post - Cocanha I

Esquerda: O vinho moscatel, o vinho verde, o tinto com mel e ervas, aqui se bebe de graça. / Direita: Escudos dobram. E podem provar ducados, aqueles que qualquer moeda desejarem.

Post - Cocanha II

Esquerda:  A panela ferve sem cessar, muitas cadeiras, poltronas, bebida, tem para quem chegar. / Direita: Aqui, as mesas para todos são sortidas, perdizes caem do céu assadas.

Post - Cocanha III

Esquerda: Prepare guloseimas a qualquer hora do dia, tortas também há neste forno. / Direita: Aqui, as casas a gente desmonta e transporta pra todo lado, e com cavalos de muita força.

Post - Cocanha IV

Esquerda: Os marzipãs e os biscoitos doces crescem como as flores do campo. / Direita: Açúcar sobra nos pães e não enjoa, e a canela tempera com eficácia.

Post - Cocanha V

Esquerda: As casas são feitas com peças de presunto, as telhas são crepes finas e redondas. / Direita: Há uma árvore frondosa, que produz para bem vestir, chapéus e calçados de todo tipo.

Post - Cocanha VI

Esquerda: Nos lagos pescamos peixes, prontos para comer, preparados de todos os jeitos. / Direita: As frutas se adoçam, amadurecendo nas árvores, e colhem-se como se fossem balas carameladas.

Post - Cocanha VII

Esquerda: A vaca, aqui, pare todo mês doze bezerros e a ovelha o dobro de ovelhinhas. / Direita: Quem quiser dormir quando o sono bate, na mesma hora a música embala.

Post - Cocanha VIII

Esquerda: Sempre ferve a banheira cheia, de água que os velhos rejuvenesce. Direita: Nesse clima, há somente dois ventos, todo dia soprando igualmente nos campos.

Post - Cocanha IX

Esquerda: Os animais são como gatinhos selvagens, que emanam perfumes sublimes. / Direita: Quando o hoteleiro recebe você na Cocanha, sua despesa já está paga.

COCANHA DE ITÁLIA

Post - Cocanha italianaPrisão para quem gosta de trabalhar e, montando o porco, o mais preguiçoso e presidente do país.  

Por força do Criador, depois do “faça-se a luz”, começou o tempo. Em seguida, veio o homem, aquinhoado com os cinco sentidos para o desfrute da natureza, sendo que a visão é o mais rico de todos. E bem sabemos que, para se completarem, a sensualidade e o prazer precisam dos olhos, com os quais, figuradamente, pode-se até mesmo comer. Do mesmo modo, servem eles para buscar sensações táteis à distância, evidentemente, através das memórias.

Pois bem, na mitologia greco-romana, Saturno* (romano) é o deus do tempo e do prazer. Mas, também, é quem cuida dos ciclos da natureza, da geração, da agricultura, da abundância, da riqueza e da satisfação. Justamente encarecendo a Saturno é que as pessoas almejam todas essas benesses, o tempo todo. Ou seja, isso é uma verdadeira cocanha! — * É o mesmo deus grego Cronos.

Contudo, apesar da confissão cristã ter se tornado predominante na Itália, o paganismo deixou marcas profundas na sua cultura. Saturno era visto também como o deus da Idade de Ouro, ou de um tempo feliz, quando todos viviam em um estado de igualdade e era certa a abundância dos frutos da terra.

Talvez provenha dessa mitologia o amor dos italianos pelo Paese de Cuccagna. Visto que o assimilaram de variadas maneiras, em palavras, imagens e ações, e com versões para todo gosto.

Um destaque da cultura pagã foi a Saturnália, o festival dedicado ao deus Saturno, quando havia a oportunidade de saciar todos os desejos. Naqueles dias, ocorria uma terapia coletiva, quando eram rompidas as barreiras sociais, inclusive as de ordem moral, de modo que todos pudessem livrar-se das suas próprias correntes e reparar frustrações. Aliás, até mesmo os escravos podiam aproveitar um pouco a vida, pois ganhavam alguns dias de liberdade.

O escritor sírio, Luciano de Samosata, descreveu detalhes do regramento dessa grande farra:

“Que ninguém tenha atividades públicas nem privadas durante as festas, salvo no que se refere aos jogos, as diversões e ao prazer. Apenas os cozinheiros e pasteleiros podem trabalhar. Que todos tenham igualdade de direitos, os escravos e os livres, os pobres e os ricos. Não se permite a ninguém enfadar-se, estar de mau humor ou fazer ameaças. Não se permitem as auditorias de contas…” 

A NOSSA COCANHA

Por sua vez os brasileiros, que adotaram uma variação da saturnália, denominada Carnaval, não poderiam ficar para trás e ganharam também uma Cocanha. Foi um presente do inspirado cordelista Manuel Camilo dos Santos(4), autor da versão nacional, que é muito apreciada pelos nordestinos. Trata-se de São Saruê(5), um lugar escondidinho, mas acessível a todos aqueles que sabem sonhar. O poeta paraibano conta uma

Viagem a São Saruê:
Post - Doutor mestre pensamento
me disse um dia: – você
Camilo, vá visitar
o país de São Saruê,
pois é o lugar melhor
que neste mundo se vê.

Eu que desde pequenino
sempre ouvia falar
nesse tal de São Saruê
destinei-me a viajar,
com ordem do pensamento
fui conhecer o lugar.

Iniciei a viagem
às duas da madrugada, 
tomei o carro da brisa
passei pela alvorada
junto do quebrar da barra
eu vi a aurora abismada.

Pela aragem matutina 
eu avistei bem defronte
a irmã linda aurora 
que se banhava na fonte, 

já o sol vinha espargindo 
no além do horizonte.

Surgiu o dia risonho
na primavera imponente, 
as horas passavam lentas
o espaço incandescente
transformava a brisa mansa
em um mormaço dolente.

Passei do carro da brisa 
para o carro do mormaço 
o qual veloz penetrou
no além do grande espaço
nos confins dos horizontes 
senti do dia o cansaço.

Enquanto a tarde caía
entre mistério e segredo
a viração docilmente
afagava os arvoredos,
os últimos raios do sol

bordavam os altos penedos.

Morreu a tarde e a noite
assumiu sua chefia,
deixei o mormaço e tomei
o carro da neve fria,
vi os mistérios da noite
esperando pelo dia.

Ao romper da nova aurora 
senti o carro pairar 
olhei e vi uma praia
ler, escrever e contar,
canta, corre, salta e faz
tudo quanto se mandar.

Lá tem um rio chamado: 
o banho da mocidade,

onde um velho de cem anos
tomando banho à vontade 

quando sai fora parece
ter vinte anos de idade.

Lá não se vê mulher feia
e toda moça é formosa

alva, rica e bem decente
fantasiada e cheirosa,

igual a um lindo jardim
repleto de cravo e rosa.

É um lugar magnífico
onde eu passei muitos dias
passando bem e gozando
prazer, amor, simpatia,
todo esse tempo ocupei-me
em recitar poesias.

Ao sair de lá me deram
uns pacotes de papéis
era dinheiro emaçado
notas de contos de réis
quinhentos, duzentos e cem
de cinquenta, vinte e dez.

Lá existem tudo quanto é beleza
tudo quanto é bom, belo e bonito,
parece um lugar santo e bendito
ou um jardim da divina Natureza: 
imita muito bem pela grandeza  
a terra da antiga promissão 

para onde Moisés e Aarão 
conduzirão o povo de Israel, 
onde dizem que corriam leite e mel 
e caia manjar do céu no chão.

Tudo lá é festa e harmonia
amor, paz, bem-querer, felicidade
descanso, sossego e amizade
prazer, tranquilidade e alegria:
na véspera de eu sair aquele dia
um discurso poético, lá eu fiz,

me deram a mandado de um juiz 
um anel de brilhante e de “rubim” 
no qual um letreiro diz assim: 
é feliz quem visita este país.

Vou terminar avisando
a qualquer um amiguinho
que quiser ir lá
posso ensinar o caminho,
porém só ensino a quem
me comprar um folhetinho.

Post - Ego sum“Carmina Burana”: Ego sum abbat cucaniensis… (Biblioteca Regia Monacensis).

O ABADE BEBERRÃO

Nos tempos da Idade Média, podia-se encontrar a Cocanha nas tabernas, onde havia vinho à vontade, farta comida e jogos. Lá, para garantir a bem-aventurança, os convivas inventaram um São Décio, dito protetor da seita dos jogadores de dados. Contudo, adoravam mesmo era o vinho, porque lhes trazia alegria e o dom da fluência verbal.

A revelação desses pormenores se deu ao encontrarem na Alemanha, em 1803, uma coleção de poemas e canções denominados Codigus Latinus Monacensis. O texto foi então divulgado, em 1847, com o título de Carmina Burana(6). Forma um conjunto de peças picantes, irreverentes e satíricas. Vinte e quatro delas foram musicadas por Carl Orff, em 1936. A que fala de um certo abade cucaniense, tem o título de Ego sum abbas. É assim:

Ego sum abbas Cucaniensis,
et consilium meum est cum bibulis,
et in secta Decii, voluntas mea est,
et qui mane me quesierit in taberna,
post vesperam nudus egredietur, 
et sic denudatus veste clamabit:
Wafna! Wafna!
quid fecisti sors turpissima?
nostre vite gaudia
abstulisti omnia!
Haha!

Sou o abade cucaniense, | meu concílio é com os bebedores, | e quero pertencer à seita de Décio* (* São Décio) | e quem me procurar de manhã na taberna, | à noite será deixado nu, | e assim despojado de suas vestes gritará: | Ai de mim! Ai de mim! | Que fizestes, execrável sorte? | Nos tomastes da vida | todos os prazeres! | Haha!

Aumente o som e assista:

E, para encerrar o assunto, digo eu:

Cansei de ser jardineiro,
Por isso dou um conselho:
Se tiver vontade de trabalhar,
Procure uma árvore frondosa,
Deite-se à sua sombra 
E espere a vontade passar.

Pesquisa, traduções e arte de Eduardo de Paula

Revisão: Berta Vianna Palhares Bigarella

———

(1) The Land of Cockayne – Desse poema há apenas um manuscrito, em Londres, na British Library (Harley – MS 913). Mede aproximadamente 10 x 15 centímetros, sem considerar os adornos. Compõe-se de várias partes, em diferentes línguas: inglês médio [Middle English], francês e latim. / O citado Enoque, pai de Matusalém, foi transportado por Deus ao invés de morrer (Gênesis 5:24 – E andou Enoque com Deus; e não apareceu mais, porquanto Deus para si o tomou.); e, do mesmo modo, aconteceu com o profeta Elias (2 Reis 2:1 – Quando o Senhor levou Elias aos céus num redemoinho aconteceu o seguinte…). Era crença que estariam ambos vivendo num paraíso, de onde retornariam no momento do fim do mundo, para participar da última batalha contra o anti-cristo.

(2) Tierra de Jauja – Com esse título o escritor espanhol Lope de Rueda, escreveu um texto – publicado em 1547 –, inspirado em fatos da conquista do Peru, por Pizarro. O nome Jauja identifica uma cidade no centro do país, fundada pelos espanhóis. No ano de 1534, antes de marchar até Cusco – capital do Império Inca –, os espanhóis instalaram-se em Jauja, que era um ponto estratégico. Ali, existiam depósitos, onde os incas guardavam imensas quantidades de alimentos, vestimentas e riquezas, o que lhes permitiu permanecer confortavelmente durante muitos meses. Lope de Rueda usou o fato para se inspirar na escrita da Tierra de Jauja. Exagerando, disse que as ruas estavam calçadas com pinhões, onde corriam riachos de leite e mel. Por outro lado, é bem provável que tenha também usado alguma cocanha europeia para construir sua nova versão.

(3) GRAF, Arturo – “Miti, leggende e superstizioni del Medio Evo”, Ed. Ermano Loescher”, 1892, p. 232

(4) SANTOS, Manuel Camilo dos – (Guarabira, PB, *09.06.1905 / Rio de Janeiro, †09.04.1987). Agricultor e tropeiro (na juventude), poeta, cantador, violeiro, marceneiro, tipógrafo, xilógrafo, datilógrafo, horoscopista. Escreveu inúmeros poemas de cordel. Em 1942, em Guarabira, instalou a Tipografia e Folhetaria Santos, transferida para Campina Grande, em 1953. Em 1957, com novos equipamentos, mudou o nome da empresa para A Estrela da Poesia.

Post - Gambá saruê

(5) São Saruê é criação do bom-humor nordestino. O nome desse santo sem igreja foi inspirado num animalzinho muito comum na região, o gambá Saruê da orelha preta (imagem à esquerda). A espécie, de hábito noturno, é um marsupial cuja fêmea possui uma abertura no ventre. Essa bolsa traz no interior as mamas e também serve para abrigar os filhotes no começo da vida. Os animaizinhos costumam ser vistos tanto em matas quanto em áreas abertas. Possuem o hábito de abrigarem-se em ocos de árvores mas, também, adaptaram-se para viver nas cidades, onde fazem os ninhos sobre forros de casas e outros recantos protegidos. Os abençoados bichinhos, quando se encontram nas áreas urbanas e próximos ao homem, têm sofrido atropelamentos e ataques de cães, e mesmo de pessoas que costumam maltratá-los por qualquer motivo fútil. / SARUÊ: vem do tupi ‘sari-gwe’, que os portugueses adaptaram para cerigoê, depois transformando-se em seriguê e, finalmente, em saruê. Na “História da Província de Santa Cruz”, de Pero de Magalhães Gândavo, impresso na oficina de Antônio Gonçalves, Lisboa, 1576, p. 22v, consta: “Outro gênero de animaes ha na terra a que chamão Cerigoês, que sam pardos & quasi tamanhos como raposas: os quaes teem hua abertura na barriga ao comprido de maneira que cada banda lhes fica um bolso, onde trazem os filhos metidos.” – O bichinho logo ficou famoso, de modo que os franceses passaram a chamá-lo de Le sarigue. A imagem, abaixo, mostra o desenho do Sarigue, feito por Jacques De Sève, em 1763.Post - Sarigue

(6) A “Carmina Burana” é uma coleção de poemas goliardos feitos preferencialmente para cantar (datam dos séculos XII e XIII). Goliardos eram jovens clérigos pobres, egressos das universidades, que vagavam sem rumo pela Europa. Donos de espírito criativo e loquacidade, disso se utilizavam para levar a vida, declamando composições satíricas e transgressoras. Desse modo, por onde passavam, conseguiam ganhar abrigo e comida, e mais alguns agrados para o sustento. Nessa rotina, perambulavam também pelas portas das universidades e tabernas, onde eram muito bem recebidos. / Em latim, Burana vem de Bura – em alemão beuern –, nome retirado de Benediktbeuern, designação do mosteiro de São Benedito (fundado em c. 739), onde foram encontrados os poemas. A partir de 1930, vivem ali os salesianos de Dom Bosco/ A temática da obra é abrangente e está distribuída nos seguintes títulos: “Carmina Ecclesiastica”, canções religiosas; “Carmina Moralia et Satirica”, cantos morais e satíricos; “Carmina Amatoria”, canções de amor; “Carmina Potoria”, sobre bebida e também paródias; “Ludi”, representações religiosas; “Supplementum”, variações sobre as anteriores. — O trecho Ego sum abbas cucaniensis está na parte denominada “Carmina Potoria”, folha 97b. — Na “Carmina Potoria”, em “Incipit Officium Lusorum”, há uma sequência de desmerecimentos ao falso São Décio, quando chamam-no de filho de Baco e mais a Post - Trajanus Deciusfrase: “Iacta cogitatum tuum in Decio, et ipse te destruet. = Coloque teu pensamento em Décio e ele certamente te destruirá”. / O personagem São Décio foi inspirado em Gaio Messio Quinto Traiano Decio (imagem à esquerda), imperador romano, no período 249/251. Sentia-se ele um ser divino e, para difundir essa ideia, mandou cunhar moedas (sertetius) com sua cabeça coberta por uma coroa radiante. No verso de uma das cunhagens, constavam as palavras Felicitas Saeculum (Século de Felicidade), como promessa de uma Idade de Ouro, o que não aconteceu. Foi um governante fraco e um dos maiores perseguidores dos cristãos, cometeu muitas violências e, onde meteu a mão, só levou o sofrimento. Quando os godos invadiram Roma, foi derrotado e morto, juntamente com seu filho Herênio Etrusco, em 251, na batalha de Abrito. O apologista cristão Lactâncio escreveu sobre o fim de Décio: “… foi repentinamente rodeado pelos bárbaros e o mataram, juntamente com grande parte do seu exército; não pôde ser honrado com os ritos do sepultamento, mas, despojado e nu, foi lançado para ser devorado pelas feras selvagens e pelas aves, um final adequado para o inimigo de Deus.

10 Comentários »

  1. Eduardo:
    Como sempre, um assunto que ficou escondido aparece em seu Blog.
    Interessante demais. Desperta muita curiosidade.

    Comentário por Maria Marilda pinto Corrrea — 01/07/2016 @ 5:50 pm | Responder

    • Marilda:
      Mais uma vez, muito obrigado. Aguarde que vem mais divertimento.
      Um abraço do Eduardo.

      Comentário por sumidoiro — 01/07/2016 @ 6:09 pm | Responder

  2. Vou-me embora pra Cocanha… Vou filiar-me à seita de São Décio… Não quero mais saber desta vida de trabalho, de horários, de compromissos…
    Lendo “Ócio e prazer”, mais um de seus brilhantes textos, como não me lembrar de “Vou-me embora pra Pasárgada”, belo poema de Manuel Bandeira, que soube criar a sua “Cocanha”.
    Eduardo, seus textos sempre me despertam para aspectos essenciais da vida, e eu lhe sou grato por isso. Não basta viver, é preciso refletir sobre o quê e como vivemos, se não quisermos correr o risco de trocarmos a Cocanha pelo inferno.
    Parabéns, Eduardo, pelo caráter instigante de seus textos.

    Comentário por Pedro Faria Borges — 04/07/2016 @ 9:40 am | Responder

    • Pedro:
      Muito obrigado por tudo, pelo comentário e pela alegria de saber que comungamos as mesmas ideias. Vamos continuar assim, em busca das nossas Cocanhas. Acredito que estamos quase chegando lá!
      Um abraço do Eduardo.

      Comentário por sumidoiro — 04/07/2016 @ 9:50 am | Responder

  3. Eduardo: Que assunto interessante, pois são muitos os que sonham com um lugar de vida plena. Eu penso nisso desde menininha, quando meu pai nos comprou o disco com a história de Alice no Pais das Maravilhas. E Alice canta uma música em que revela o desejo de ter um mundo só dela. “Meu gatinho ia ter um lindo castelinho, ia andar todo bem vestidinho se eu vivesse nesse mundo só meu..” Um frade achando o paraíso chato. Muito divertido. Lembrei aqui de Pasárgada, que também é um lugar muito especial.

    Comentário por sertaneja — 13/07/2016 @ 12:54 am | Responder

    • Virgínia:
      De fato, o país de Alice é também uma cocanha.
      Muito obrigado e um abraço do Eduardo.

      Comentário por sumidoiro — 17/07/2016 @ 7:31 am | Responder

  4. Obrigada, Eduardo, por nos apresentar universos insuspeitáveis de uma forma agradável e leve, nos transportando até lá. Com sua erudição, vai descortinando pequenos detalhes que ficaram em nós como arquétipos! Quando criança, o cordel pertencia à classe pobre, e nossas empregadas costumavam ler as histórias para nós, ou então ouvíamos de algum cantador, tudo misturado com contos de fadas europeus. O ser humano é mesmo o princípio e o fim…

    Comentário por Vania Perazzo Barbosa Hlebarova — 24/02/2017 @ 8:46 pm | Responder

    • Vania:
      Vivi e fui aprendendo. Até que, de repente, percebi que há momentos em que a realidade e o sonho se confundem. Hoje, no meu caminhar, sempre estou com um pé de cada lado. E, feliz, na minha Cocanha continuo vivendo.
      Muito obrigado e um abraço do Eduardo

      Comentário por sumidoiro — 24/02/2017 @ 9:31 pm | Responder

  5. Em Cocanha a vida é livre e leve. Será que nem briguinhas de beberrões, jogadores ou vizinhas faladeiras ali ocorrem? Parabéns pelo excelente texto e desculpe-me pela brincadeira.

    Comentário por Ydernéa — 09/02/2021 @ 2:26 pm | Responder

    • Em Cocanha tudo vale, menos trabalhar.

      Comentário por sumidoiro — 09/02/2021 @ 9:47 pm | Responder


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